Sempre foi assim

A opinião publicada recebeu com pasmo, indignação e revolta a divulgação pela televisão dos vídeos em que Marcelo Odebrecht conta, com a maior naturalidade, que o financiamento das campanhas eleitorais sempre foi com (ou pelo) Caixa Dois. Depoimentos de outros diretores do Grupo Odebrecht seguem o mesmo tom coloquial, sem emotividades, sem demonstração de arrependimento. São tratados como atos corriqueiros, usuais e normais. E eram. Apenas a sociedade, fora do círculo das relações promíscuas entre políticos e empreiteiros de obras públicas, não tinham conhecimento. Agora passaram a ter.

Diante essas revelações, há algumas indagações que tentarei responder aqui:

  1. se sempre foi assim, porque o seu agigantamento nas gestões do PT?
  2. o que levou ao seu desmantelamento?
  3. foi efetivamente desmontado ou ainda continua?
  4. como pode ser evitado no futuro?
A lista de Fachin remonta a um passado mais remoto, alcançando José Sarney, o primeiro presidente com a redemocratização e ainda vivo. Não retrocede aos tempos da ditadura militar. Quando também havia.

Com todos os seus sucessores o processo (chame-se de modelo, esquema ou qualquer outra denominação) ocorreu, com maior ou menor conhecimento de cada Presidente. 

Fernando Henrique Cardoso, pode não ter gerido, tampouco participado diretamente do processo, mas não era ingênuo para não saber que ocorria. Ou que era assim que funcionava. Ainda mais tendo a formação de sociólogo e cientista políticos. 


Mas o esquema era limitado e discreto. Não plenamente centralizado, mas também não inteiramente descentralizado, como ocorreu posteriormente.

O PT assumiu o modelo como a principal sustentação do seu projeto nacional e de poder. 

Em que pesem todas as controvérsias, muito carregadas emocionalmente, os fatos históricos comprovam que o PT tinha um projeto nacional, com objetivo principal de reduzir as desigualdades econômicas e sociais. A comprovação de que houve esse projeto é que não deu certo e acabou por provocar a maior e mais prolongada crise econômica do país. 

Para implantar essa visão de um Brasil, socialmente mais justo, era preciso conquistar e manter o poder. Não por um mandato, mas por longo prazo. Pelo menos 20 anos, tempo inicialmente pretendido pelo PSDB. Ou seja, cinco mandatos sucessivos. 

Nesse prazo o PT pretendia mudar o país.

Embora o partido tivesse surgido e crescido com base nos operários paulistas, com apoio da Igreja Católica e movimentos favoráveis à justiça social e à ética na política, contando com um lider carismático, foi sucessivamente derrotado em duas eleições presidenciais.

Ao perceber ou presumir que apenas o apelo social e ético não eram suficientes para a conquista do poder, incorporou o modelo dos seus adversários vitoriosos: irrigar as campanhas eleitorais com amplo uso do marketing político e muito dinheiro. Buscando-o da mesma forma que os outros: com os "empreiteiros".

Foi muito bem sucedido nesse projeto, criado e gerenciado por ilustres hóspedes em Curitiba, contando para isso com a contrapartida de alguns "empreiteiros" que viram e usaram o modelo para o seu rápido e imenso crescimento.

E tornaram o modelo, o paradigma das relações contratuais entre o Governo, incluindo as estatais, e os construtores. 

Animado com o sucesso do modelo, através da conquista do poder com a eleição de Lula, em 2002, o partido buscou a sua ampliação para garantir uma base de sustentação no Congresso. 

O modelo quase naufragou com o "Mensalão", mas o PT e seus aliados conseguiram salvá-lo, apesar de algumas baixas importantes, nos seus quadros dirigentes. E com a colaboração daqueles, remontaram o modelo de forma mais ampla na Petrobras. Embora não tenha se limitado a ela.

Transformaram uma doença controlada numa epidemia, com ampla contaminação através dos vírus produzidos nos laboratórios das empreiteiras. 

Nem mesmo a deflagração da Operação Lava-Jato suspendeu a sua prática e continuidade. O modelo só refluiu com a redução das contratações de novas obras. Mas foi contido na execução das obras e pagamentos das parcelas, onde eram sempre cobradas as contribuições (caracterizadas pela OLJ e difundidas pela mídia, como propinas).

(cont)






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