A implosão do Paes de Almeida não fez desabar a política habitacional

A implosão do Edifício Wilton Paes de Almeida, tomado pelo fogo e onde moravam centenas de famílias que o invadiram, tem sido comentada com as mesmas críticas de sempre sobre as políticas públicas habitacionais, sem mudanças de paradigmas. O fracasso das políticas habitacionais não decorre da falta de integração entre políticas urbanas e sociais.
A base do fracasso está no tradicional paradigma da casa própria. 
Não há qualquer possibilidade de resolver - nem a curto, tampouco a médio prazo -  o problema habitacional, com a idéia de que todo mundo deve ter a sua casa própria.  Dai se fazem as contas das centenas ou milhares de anos para alcançar um objetivo equivocado.
A questão não é proporcionar a todos uma casa própria - "um teto próprio" - mas que todos estejam abrigados dentro de uma moradia adequada.
Essa não precisa ser própria. Pode ser alugada, cedida ou de uso temporário, remunerada ou não. Na prática existem duas outras alternativas, não reconhecidas como adequadas: a própria, supostamente precária, e a ocupação por invasão.
Aqui começa o segundo grande equívoco que dificulta ou impede a solução do problema habitacional: o que é moradia adequada?
Essa tem sido definida - predominantemente pelos arquitetos - a partir dos seus padrões de vida, isto é, da classe média, para cima. O que além de tornar os imóveis mais caros, tem desenho e composição que não se coadunam com o modo de vida da maior parte da população, que é da classe média para baixo. 
Começa com uma diferença de nomenclatura: a classe média quer residência e a chama de habitação. O "povão" quer morar, quer moradia. 
Por essa visão mais física do que social das condições de habitabilidade, há um enorme déficit habitacional, que não corresponde à demanda habitacional reprimida. 
A figura do "déficit habitacional" foi criada e e desenvolvida patrocinada pela indústria da construção, para que governos estabelecessem políticas públicas de financiamentos e outras condições favoráveis, para incentivar a construção empresarial de habitações. Seja por conta própria, mas com apoio financeiro favorecido, dos Governos, como "empreiteiros" da construção de habitações com recursos públicos. E o setor aduz e seduz com a perspectiva de criação de empregos. 
Essas políticas já foram adotadas várias vezes, deixando sempre rastros de grandes "buracos financeiros" ou "esqueletos impagáveis", mas acabam sempre voltando, com os mesmos defeitos. O Sistema Nacional de Habitação, com o BNH e outras entidades, foi desmantelado - não extinto - deixando grandes sequelas indesejáveis.
Com defeitos ainda piores, governos anteriores criaram o "Minha Casa, Minha Vida" que os novos não tem coragem de extinguir, mas o estão matando pela redução sucessiva de recursos financeiros. O Estado Brasileiro não tem mais condições de sustentar ao mesmo tempo, uma máquina administrativa cara e ineficiente, e amplos programas sociais. Já sacrificou inteiramente os investimentos e, apesar das promessas políticas, terá que sacrificar um dos dois, ou mais um do que outro. Os servidores públicos tem mais força politica e vão perder menos. Os programas sociais vão perder mais e os primeiros cortes, que já vem sendo efetuados são dos subsídios dos programas habitacionais. O Minha Casa, Minha Vida vai morrer por inanição. 
Quem ainda acha que essa é a solução, está inteiramente iludido. Ou é um utopista.

Para resolver a médio prazo, o problema da moradia, será necessário "reescrever" e adotar as soluções, com base em novos paradigmas. As duas principais já referidas são: "a solução não é a casa própria, mas a universalização da moradia adequada"; e moradia adequada é uma condição social e não física, tampouco estética: favela é solução para eliminar o "déficit de moradias".
Houve avanços, mas também retrocessos. Mas atualmente a visão de que "favela não é problema; favela é solução" já é mais aceita, ainda que sob o eufemismo de "comunidade". Favela como solução não é favela: é comunidade.
A solução "urbanização de favelas" foi transformada em "transformação em bairros", com grandes obras de infraestrutura, por interesse das empreiteiras. Foi mais um grande desvio de recursos públicos, estancado pela Operação Lava Jato, mas com o estancamento do principal, isto é, dos programas de urbanização.

Casa própria não é a solução para o problema da falta de moradias. Déficit habitacional é um parâmetro da indústria da construção. O déficit real, que precisa ser considerado é o "déficit" de moradia.

Mas tudo isso é questão de médio e longo prazos. Existe o problema atual, imediato.

(cont)





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