Coisas estranhas neste Brasil: amadorismo demais

A sociedade brasileira ficou estupefata com a organização da Odebrecht para conceder e gerenciar as propinas, com o objetivo claro de ampliar os seus negócios junto aos órgãos federais: sejam contratantes de obras, como financiadoras de suas atividades. O BNDES foi o principal instrumento utilizado para esse segundo fim. Com operações, aparentemente legais, mas com atendimento privilegiado. As regras estabelecidos foram gerais, mas só poucos conseguiam ter acesso.

Além da Odebrecht, o maior atendido pelo BNDES foi a J&F, que com ações de grande ousadia, transformou um pequeno açougue do interior de Goiás no maior conglomerado mundial do setor de carnes. Parte das suas ações - sempre elogiadas pela mídia - eram públicas e transparentes. Até porque necessárias para captação de recursos privados no mercado acionário. Outras, nem tanto, sempre cercadas de desconfianças pelo mercado. 

Os irmãos Batistas eram conhecidos pelas suas relações, nem sempre republicanas, com as autoridades. 

Marcados por essa imagem, o que a mim surpreende, ao contrário da reação geral, é o amadorismo com que as autoridades, agora supostamente referidas na delação, também suposta, agiram. 

Se há - e tudo indica que sim - uma grande quadrilha no poder, é uma quadrilha amadora, para não aceitar que seja ingênua.

Como o Presidente da República recebe oficialmente um conhecido doador de recursos supostamente espúrios, e trata de questões particulares escusas? E mais, não toma nenhum cuidado com a possibilidade de gravação. E não seria pela primeira vez. Há o precedente do ex-Presidente da Transpetro, Sérgio Machado. 

De outra parte, um Senador que além do mais é presidente de um dos maiores partidos brasileiro e supostamente candidato à Presidência, estaria pedindo descaradamente 2 milhões de reais. Supostamente para cobrir custos com a sua defesa em outros processos. Mas por que a J&F e porque esta acederia em atender? Neste jogo, nada se faz de graça. Então qual seria o interesse da J&F em atendê-lo?

A movimentação dos irmãos Batista junto ao Ministério Público e Polícia Federal vem ocorrendo ao longo deste ano. Supostamente para responder às denúncias em outros processos. 

Mas se gravaram foi na tentativa de obter proteção e chantagear as autoridades que, supostamente, os estariam abandonando. 

O processo de delação, ainda que espontânea, foi inteiramente conduzida em sigilo, incluindo a suposta homologação pelo Ministro do STF, Edson Fachin, que neste caso, não seria o juiz natural. Sem que ninguém soubesse. Sem que as autoridades sequer desconfiassem e continuassem mantendo as relações espúrias. 

Com um agravante. O Ministro teria autorizado a Polícia Federal a gravar conversas com o Presidente da República, o que seria uma extrapolação de atribuições. 

Do lado do Ministério Público, da Polícia Federal, extremo profissionalismo. Do lado das autoridades envolvidas, total amadorismo. Será crível? Supostamente o lado investigador deixou os irmãos Batista livres e soltos, mas orientados e monitorados pela Polícia Federal, para obter provas. Para gravar conversas comprometedoras. Tudo como em filmes policiais, de espionagem ou de investigação. A PF brasileira teria aprendido tudo com os filmes de James Bond e as séries do CSI. São as chamadas ações controladas.

A ação do colunista que divulgou a notícia, com a cobertura do jornal, faz parte do jornalismo alimentado por vazamentos seletivos.

O colunista, de bastidores políticos, não é investigativo, mas receptor de informes transmitidos de forma também espúria e ilegal. 

Alguém, de dentro da Polícia Federal ou do Ministério Público passou a informação ao colunista. Uma informação que, supostamente, estaria protegida pelo sigilo judicial. Com que intenções?

Derrubar o Presidente, gerar uma nova crise política?

Neste caso, há uma suposição lógica, para o momento: evitar a aprovação da reforma previdenciária que reduziria privilégios da previdência pública, ou seja, dos servidores públicos. 

Quem é do ramo sabe que a Polícia Federal é dividida em muitas facções e dificilmente se consegue manter o sigilo total de uma investigação de vulto, sem que acabe vazando. É preciso ter um forte interesse comum e esse é o corporativo. 

Do ponto de vista jurídico e processual há ainda muitas dúvidas e esquisitices. Mas do ponto de vista político os impactos são efetivos e irreversíveis.

Se confirmada a gravação, que ainda não veio a público, o Presidente Temer deveria renunciar por incompetência. Não serve nem para ser o "chefe da quadrilha". Por tamanho amadorismo.

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