A crise do afastamento de Renan Calheiros da Presidência do Senado teria base jurídica e não política, tampouco baseado no "clamor popular".
O clamor popular das grandes cidades não deixa dúvidas: Fora Renan foi o principal tema e todas as manifestações.
Como temos uma democracia representativa e não direta, o povo elege os seus representantes e são eles que tem o poder de governar e legislar. O Judiciário no Brasil não é eleito, mas tem o poder de interpretar as leis e exigir a sua aplicação, sob pena de multas, prisões e outras eventuais condenações.
É uma crise política, institucional, mas procura-se minimizar essa dimensão.
A crise jurídica se centra no STF, com repercussão externa. Há divergências, mas essas precisam ser resolvidas à luz das leis e das doutrinas. Não por emoções, tampouco por razões pessoais e contra pessoas.
O que está em questão é a ocupação ou não por réus de processos no STF de cargos que estão na linha sucessória da Presidência da República, ou sejam, na ordem, o Presidente da Câmara dos Deputados, o Presidente do Senado Federal e o Presidente do Supremo Tribunal Federal.
Está em processo de votação uma representação do partido Rede de Sustentabilidade, requerendo uma decisão do STF para impedir que réus ocupem cargos que estão nessa sequência de substituições do Presidente. Não é uma situação concreta, mas potencial, podendo ocorrer ou não.
Uma interpretação é que o réu não possa assumir a Presidência, no caso da vacância ou ausências dos anteriores na sequência, mas não impede que se mantenham nos respectivos cargos. A incompatibilidade não seria com o cargo legislativo, mas com o exercício - mesmo interino - da Presidência.
Embora o resultado parcial já tenha 6 votos, o suficiente para a aprovação, da proibição, o Ministro Dias Tóffoli pediu vistas e os Ministros que já votaram podem mudar o seu voto, a menos que tenham deixado a Suprema Corte.
No caso específico, o Presidente da Câmara dos Deputados não pode "entregar a faixa" ao Presidente do Senado, devendo convocar a Presidente do STF.
O Presidente do Senado continuaria no cargo, exercendo as suas funções, mas seria "caroneado" caso o Presidente da República e o Presidente da Câmara dos Deputados se ausentem do país, ao mesmo tempo, ou sejam impedidos.
A outra interpretação é que todos os ocupantes de cargos da linha sucessória da Presidência tenham que deixar o cargo, quando viram réus, mesmo que nunca venha a ocorrer a hipótese do Presidente do Senado ou a do STF venha ocupar a Presidência da República.
Se prevalecer essa tese, a quem caberia promover a destituição do tornado réu no STF? O STF ou a própria casa do Congresso?
Tanto na Câmara dos Deputados, como no Senado, o entendimento dos parlamentares é que o poder de destituir é deles.
Mesmo partindo do STF uma destituição determinada pelo Judiciário significaria uma interferência indevida de um Poder em outro, quebrando a independência dos poderes, o que seria cláusula constitucional pétrea.
Se o STF decidir que réu em processo judicial não pode exercer cargo de direção nos Poderes, caberia ao próprio poder promover o afastamento.
Se o STF reformar a decisão monocrática do Ministro Marco Aurélio Mello, poderá ficar configurado um caso de abuso de autoridade. O pleno do STF cuidará para que isso não ocorra, caracterizando como divergência de opiniões.
O que interessa, mais uma vez não é o fato, mas a versão.
Para a maior parte dos Senadores, o ato de Marco Aurélio será visto como abuso de autoridade, e poderá ser um tiro no pé.
O Senado aprovará urgência na discussão do dito projeto de lei de abuso de autoridade e o aprovará, ainda em 2016. Contrariando o clamor do povo.
Atualmente há mais incendiários do que bombeiros. E a mídia não tem a iniciativa de começar o fogo, mas se delicia em derramar mais gasolina, na expectativa de ganhar mais público.
Quem irá assumir o papel de pacificador desse confronto que está ganhando grandes proporções?
(cont)
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