quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

O primeiro cadáver relevante

Aconteceu o anunciado, mas de forma inesperada.
Era esperado que das manifestações de rua, com crescente violência, com a transformação de áreas da cidade em praças de guerra, alguém viesse a morrer.
Uma morte, nessas manifestações, iria gerar uma comoção social e, provavelmente, uma mudança nos rumos do processo. 
Os manifestantes mais radicais ficaram provocando a polícia, contando com um "mártir". Uma vítima da truculência policial seria o combustível para atrair a simpatia e a adesão da sociedade. Poderia ser qualquer cidadão, vítima de uma bala perdida, ou de um atropelamento. Esse até teria ocorrido, mas não teria sido divulgado.


Mas o que ocorreu foi diferente, fartamente registrado.
Por acidente, um rojão, um artefato pirotécnico deixado a esmo, na superfície da praça, atingiu um cinegrafista da televisão, em serviço, provocando a sua morte, 4 dias depois de uma agonia numa UTI, prolongando e amplificando o drama.
Não foi a primeira vez que um artefato pirotécnico causou uma morte comovente. Na Bolívia um desses, também solto a esmo, matou um jovem torcedor boliviano. Não esquecendo que foi um desses que deu origem ao incêndio na boate Kiss, em Santa Maria, causando a morte de mais de 200 jovens.

Santiago Andrade não foi o primeiro morto, dentro das manifestações. Dois ou mais morreram em Belo Horizonte, nos movimentos de junho de 2013, mas por terem sofrido queda de um viaduto. A comoção foi limitada.

Mas a morte de um cinegrafista em serviço, tem uma repercussão muito mais ampla. Toda mídia se irmana em sua homenagem e à dor dos familiares. O tempo dedicado a ele na televisão é enorme, estendida pela demora na prisão do responsável, agora tratado como assassino. Assassino de um trabalhador. A difusão da indignação é maior.

O que acontecerá doravante com as manifestações?


Os que vão às ruas para protestar pacificamente continuarão indo? Uma parte, provavelmente sim, mas o número tenderá a ser cada vez menor, até se limitar a pequenas manifestações pontuais.

Os black blocs continuarão indo? Sim. São pessoas ressentidas, que se sentem oprimidas e acabam se manifestando violentamente, sem medir as consequências. São, fundamentalmente, inconsequentes e não se intimidam com a campanha da mídia. Ao contrário, aumenta a sua reação contra os profissionais. Eles não são mais vistos como gente em serviço, mas como "lacaios de um sistema falido". Passam a ser vistos como "inimigos".
A sua lógica é contrária: "quem mandou esse sujeito ficar na linha de tiro?". A culpa é da Band que manda o sujeito a cobrir as manifestações sem capacete, e por ai vai. O culpado, para eles é a vítima. É a sociedade. Eles apenas reagem. Vão continuar e aumentar o atrito com os jornalistas. Esses antes não reagiam. Agora já começaram a reagir. O clima de confronto vai aumentar.

Quem poderá deixar de ir é o oportunista que aproveita a oportunidade para saquear e furtar. É gente pobre, meninos de rua, integrantes de gangs que se misturavam na massa. Com uma massa menor, ficando mais fácil serem identificados nas suas contravenções, crimes e de serem detidos, não vão se arriscar tanto. Esses não vão engrossar os black blocs. Aproveitavam as mesmas táticas, mas sem os mesmos objetivos.

Há uma inversão na composição da massa de manifestantes. Inicialmente os pacíficos eram maioria e tomavam a iniciativa do processo, contando com o apoio dos black blocs, dos pequenos marginais e a adesão espontânea da população. Principalmente quando a reação policial, sempre truculenta, era mais evidente.

Agora a iniciativa e o comando é dos black blocs (bbs), contando com a adesão de pessoas que, emocionalmente, apoiam as suas ações. O bbs fazem aquilo que eles gostariam de fazer, mas não tem coragem. Tem receio das consequências, o que os bbs não tem.

O que vai ocorrer na sequência depende da reação policial e das autoridades. 

Se a reação for de inteligência e de estrategia, as manifestações vão minguar e desaparecer. Se for a tradicional, de repressão, só vai aumentar a indignação e, passado o luto, o povo voltará às ruas. 

De toda forma, o grupo "não vai ter Copa" irá às ruas, ficando apenas a dúvida se com grande ou pequeno volume de pessoas.

Saberá o Governo agir com inteligência? Ou vai continuar panglossiano?

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