sábado, 28 de dezembro de 2013

Os legados da Copa - "padrão FIFA"

Os Presidentes do Brasil e da FIFA acreditavam, em 2007, que a escolha do Brasil para a sede da Copa do  Mundo, em 2014 reforçaria a unidade nacional, melhoria a auto-estima do brasileiro, superaria o complexo de "vira-lata", geraria um clima de euforia e entusiasmo favorecendo o crescimento econômico e a redução das desigualdades sociais.
Afinal o Brasil é o país do futebol e só, uma minoria insignificante, de pessimistas e mal humorados, ficaria contra a Copa e os seus gastos. 
A Presidente Dilma, para justificar os gastos e a subserviência às exigências da FIFA, chegou a distorcer a frase célebre de Nelson Rodrigues "o escrete é a pátria em chuteiras", para afirmar que o Brasil é a "pátria em chuteiras".

Não foi o que ocorreu nas manifestações de rua, em junho de 2013.
Os gastos com a Copa foram um dos principais alvos de contestação dos manifestantes que usaram o mote "padrão FIFA" para exigir o mesmo tratamento dado pelo Governo às ações e obras preparatórias para a Copa, para os serviços públicos de educação e saúde.
Poderiam as novas gerações que terão que pagar as altas contas assumidas com os estádios, as terem evitadas? As manifestações chegaram tarde quando os estádios já estavam em estágio avançado de construção.

O Governo não consultou a população, nem mesmo os legislativos. Assumiu compromissos em nome do povo brasileiro e só cinco anos depois ele acordou. Não foi por falta de informação, mas de buscá-la e utilizá-la. No Portal da Copa, depois alterada para Portal 2014 (www.portal2014.org.br ), por exigência da FIFA, desde 2008 mostrava os dados sobre o volume de obras - já elevados e depois ainda mais ampliados - e a avaliação da inviabilidade econômica da maioria dos estádios.

Mas será que em 2008 os jovens de Manaus e Cuiabá iriam às ruas? Iriam dizer ao Governo: não precisamos da Copa aqui. Não queremos a Copa aqui. Juntamente com os jovens de Campo Grande e de Belém. Será que os jovens brasilienses iriam às ruas para dizer que não precisamos reformar o Mané Garrincha, porque não tem futebol bom na Capital Federal e dois outros estádios tinham sido reformados há pouco tempo?. Será que os black blocs teriam espaço e apoio para se opor à reforma do Maracanã a valores exorbitantes. em 2009 ou 2010?

Não foram às ruas em 2008. Nem em 2009, para indicar que o Brasil não estava a favor de uma custosa Copa, no país.
Mas foram em 2013 e voltarão às ruas, melhor informados e inconformados. A cortina de fumaça que o Governo Federal tem lançada, para tentar conter a revolta popular, persistindo na inverdade de que não há recursos públicos na construção dos estádios "padrão FIFA" não se sustenta, pela realidade objetiva e comprovada. É verdade que não existem recursos do Orçamento Fiscal da União, de origem tributária e sem retorno para aplicação nos estádios. Houve, no entanto, recursos desse orçamento para reforçar o caixa do BNDES para o financiamento da construção dos estádios.

A maioria dos estádios teve os seus recursos assumidos pelos Governos Estaduais. Dos doze, apenas três são de clubes e inteiramente privados, embora com subsídios públicos. Dos nove demais, Manaus, Cuiabá, Brasília e Rio de Janeiro foram feitos com recursos orçamentários dos respectivos Governos Estaduais. 5 foram construídos ou reformados com recursos privados (Fortaleza, Natal, Recife, Salvador e Belo Horizonte). Mas esses foram construídos na modalidade de concessão administrativa, dentro das parcerias público-privadas, o que quer dizer que ao longo do período de concessão o Governo Estadual irá arcar com uma mesada para o parceiro privado. É o "mensalão" da Copa. No caso do Rio de Janeiro a situação é inversa: é o parceiro privado que deverá aportar uma mensalidade para o Governo Federal, mas insuficiente para amortizar o investimento feito, e talvez insuficiente mesmo para os pagamentos da dívida assumida junto ao BNDES. 

Há recursos públicos e não poucos investidos nos estádios e a vã tentativa das autoridades em não reconhecer e até mesmo contestar essa realidade só aumenta a indignação e o inconformismo dos jovens. Persiste a sensação de que estão sendo enganados: e estão.


O Governo persiste na tese, a fim de evitar a comparação de que esses gastos públicos poderiam ser destinados à melhoria da educação e da saúde. Mas não conseguirão, porque o desempenho da educação brasileira continua ruim nas classificações internacionais e as pessoas percebem, no dia a dia, as deficiências da educação pública.

A situação da saúde pública é pior ainda. O atendimento do SUS é demorado e precário. Não adianta do Governo dizer à população o quanto está gastando e que está implantando o Programa Mais Médicos. Enquanto os estádios estão sendo concluídos e inaugurados  os resultados na saúde pública ainda não apareceram de forma significativa.

Em 2014 serão inevitáveis as manifestações populares criticando a preparação para a Copa, e exigindo o padrão FIFA para a educação e saúde. 

Estudos recentes indicam que os estádios brasileiros para a Copa estão entre os mais caros do mundo e as despesas totais, só com os estádios, já estimadas em torno de 9 bilhões de reais são as maiores entre todas as Copas.

Tal volume de recursos, embora nem tudo seja com recursos públicos, para um evento esportivo particular, gera insatisfação e mesmo indignação, que eclodirá em novas manifestações de rua, não obstante toda campanha, liderada pela Rede Globo, juntamente com os patrocinadores da FIFA e da Copa, para gerar um ambiente favorável e de entusiasmo popular com a realização da Copa. 

"Padrão FIFA" será um dos principais legados da Copa 2014? 
Voltarão os manifestantes às ruas após a realização do grande evento, reclamando pelo "padrão FIFA", ou este perderá sentido, em 2015 e anos subsequentes?

Os indícios são de permanência, tanto para justificar aumentos de preços dos ingressos nos estádios ou de outros produtos relacionados com o futebol. "Por que está mais caro? porque é padrão FIFA, oras".
A Copa promoverá uma inflação futebolística que será ainda maior se o Brasil conquistar a taça. Terá influência reduzida nos índices gerais de preços, mas gerará uma sensação de aumento da carestia.

Servirá também para cobrança ou exigência de melhoria da qualidade nos produtos ou serviços. "Quero padrão FIFA". Ninguém saberá precisar qual é esse padrão, apenas que é superior ao usual.

E a qualquer deficiência nos serviços ou instalações dos estádios o bordão será "não tem padrão FIFA". Substituirá o atual "imagine na Copa...".




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