A divulgação de mensagens atribuídas ao então Juiz Sérgio Moro e o Procurador Daltan Dallagnol, coordenador da força tarefa da Operação Lava-Jato, traz à tona três dimensões da justiça: a Justiça (com a inicial maiúscula) Legal, a justiça política e a justiça popular.
No combate à corrupção prevaleceu a justiça popular e desde o processo do "mensalão" a sociedade organizada passou a apoiar as decisões da Justiça, para a condenação de eminentes personalidades da vida brasileira. Nessa etapa, foram condenados vários líderes políticos, sendo o mais visível, o ex-Presidente do PT e "homem forte" do Governo Lula, José Dirceu.
Já se percebia a adoção de medidas heterodoxas, principalmente de parte do Ministério Público, caracterizadas pela justiça política, como abuso de autoridade. As tentativas de barrar essas ações, foram contidas pela justiça popular que foi às ruas em 2013 e apoiou a corporação dos procuradores para evitar a chamada "lei da mordaça".
Isso deu maior força à corporação que, com o apoio do Juiz de 1ª Instância Sérgio Moro, levou à prisão um conjunto dos principais empresários do setor de construção, um dos maiores do país, assim como a devolução de bilhões de reais desviados de empresas públicas, a favor de políticos e dos próprios empresários. E desmontou o maior esquema mundial de corrupção devidamente apurado.
Eram patentes, nos processos os desvios de conduta, do ponto de vista estritamente legal, com extrapolação de autoridade. O Juiz Sérgio Moro não só era reconhecido como o principal mentor da Operação Lava-Jato, embora o seu papel legal seria apenas de julgar as questões que lhe eram submetidas formalmente (pelos autos). Era evidente o seu papel de principal mentor e estrategista da Operação, nas suas diversas fases.
A mídia reconhecia a existência de uma força tarefa conjunta entre o Judiciário, Ministério Público e Polícia Federal, a sociedade reconhecia que a essa ação coordenada (embora acima da lei) era fundamental para o sucesso das Operações. E via em Sérgio Moro o principal paladino do bem sucedido combate à corrupção, não obstante os terríveis danos colaterais.
Com essa ação coordenada a "República de Curitiba" condenou, prendeu e mantém presos grandes figuras do meio empresarial e político, sendo o principal o ex-Presidente Lula. E deu margem ao desenvolvimento da "República Carioca", tanto ou mais abusiva que a de Curitiba.
Dentro da Justiça Legal uma voz discordante tentou barrar os "abusos", o que levou o Ministro Gilmar Mendes a ser demonizado pela justiça popular.
A justiça política tentou barrar os abusos da Justiça Legal, mas o máximo que conseguiu foi evitar a aprovação do pacote das dez medidas contra a corrupção. Por não contar como apoio da justiça popular e o risco dos parlamentares a não serem reeleitos. O que, de fato, ocorreu, embora não inteiramente.
Com a divulgação de mensagens atribuidas a Sérgio Moro e Daltan Dallagnol, obtidas de forma ilegal, com a invasão de telefones pessoais, mudaram as circunstâncias.
A justiça política retomou a agenda da limitação dos abusos de autoridade da Justiça, Ministério Público e também da Policia Federal, agora com a corporações enfraquecidas, pela perda de apoio parcial da justiça popular.
Esta foi abalada com as divulgações, embora cética em relação à veracidade das transcrições. Sérgio Moro, agora Ministro, teve perdas, mas mantém o apoio da maior parte da sociedade organizada e, aparentemente, de toda a população.
Dentro desse novo quadro, o PT tenta, mais uma vez, libertar Lula, o seu principal líder, com uma inversão do jogo: torna o acusador em acusado.
Tentou, ontem (25.06.2019) transformar o julgamento de habeas corpus do ex-Presidente Lula, em julgamento da suspeição de Sérgio Moro. Que se aceito, poderia acarretar a anulação de todo o processo de condenação de Lula, no caso do triplex do Guarujá e libertá-lo da prisão.
Não conseguiu, mais uma vez. Nos dois julgamentos, a 2ª Turma se ateve ao pedido de habeas corpus, recusado pelo STJ. Confirmou a sentença.
No segundo julgamento, a defesa de Lula, também foi derrotada, com o voto decisivo do decano Celso de Melo, que se manteve restrito aos autos e não viu qualquer novo a favor de Lula, para que responda em liberdade. As razões de suspeição de Sérgio Moro não foram consideradas, por Celso de Melo, nesse julgamento, porque não estavam na pauta. Estariam no voto do Ministro Gilmar Mendes que pediu adiamento do seu pedido de vista.
Gilmar Mendes tem se pautado pela rigorosa defesa da legalidade, inaceitando e combatendo as extrapolações de autoridade de República de Curitiba e da carioca. Enfrentando a ira da justiça popular que quer a condenação dos políticos e empresarios corruptos, não importa se "um pouquinho acima da lei".
Mas, com a ferrenha posição "garantista", embora a justiça popular desconfie de outras intenções além da doutrina jurídica, ele precisa de sólidas argumentações legais para obter o voto de Celso de Melo, visto como "garantista" e "legalista", sem outros intenções.
As expectativas são de um voto decisivo do decano Celso de Mello, tido como extremamente legalista. O que levaria, a votar contra Sérgio Moro.
A mídia tem o direito de ocultar a fonte, mas isso do ponto de vista estritamente legal seria suficiente para não reconhecer as provas.
Sérgio Moro reconhece ter trocado mensagens com os procuradores, mas não reconhece ou confirma o conteúdo.
As mensagens trocadas pelo aplicativo de origem russa, Telegram, não ficam registradas nos bancos de dados do aplicativo, seja em terra ou em nuvem. Ficam restrita aos aparelhos celulares dos mensageiros e são criptografados e apagados automaticamente.
Tanto Sérgio Moro, como Daltan Dallagnol afirmam que desativaram o uso do aplicativo e não tem mais acesso às mensagens trocadas que teriam sido automaticamente apagadas. Não teriam, em condições normais, como comprovar eventuais adulterações dos originais, pois esses não mais existiriam.
Para eventuais comprovações eles precisariam entregar os seus aparelhos à Policia Federal que, com auxílio de "contrahackers" recuperaria os arquivos, como os hackers conseguiram fazer.
Por outro lado, o The Intercept Brasil, para comprovar a veracidade das transcrições teria que revelar a fonte. E essa teria que entregar os originais para a devida perícia, seja pela Polícia Federal ou outra entidade internacionalmente acreditada.
Sem essas condições as transcrições são aceitas pela justiça política e pela justiça popular, mas não pela Justiça Legal.
Se o decano Celso de Melo, atuar nos estritos termos da lei, como dele se espera por todos os seus antecedentes, ficará na preliminares: não aceitará as transcrições como provas da suspeição de Sérgio Moro. A ilegalidade na obtenção das mensagens e a falta de comprovação da autenticidade das mesmas, leva o legalista ortodoxo a recusá-los. O que significa que não há fundamentos legais para a acusação de suspeição do ex-Juiz Sérgio Moro nos julgamentos da Operação Lava-Jato.
Deve ser por isso que Gilmar Mendes não apresentou o seu voto no mérito. Ele precisa reforçar as condições legais das transcrições, para poder convencer Celso de Melo a aceitá-las como prova de suspeição.
A transformação de fonte anônima em identificada, através da publicação na imprensa, nem sempre é aceita na Justiça Legal. Principalmente pelo voto dos juizes garantistas e legalistas.
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