quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Quem vale mais? O candidato ou o partido?

Nas eleições para o legislativo os eleitores votam num candidato e num partido, dentro de um sistema caracterizado como proporcional, diferentemente do modelo majoritário, aplicado na eleição para o Executivo, em que vale apenas os votos recebidos pelo candidato. Ganha quem tem mais votos, em um ou dois turnos.

No sistema proporcional, em função dos votos válidos (excluidos os nulos e em branco) é calculado o quociente eleitoral. Esse quociente define o número de vagas a serem preenchidas pelo partido ou coligação.


O candidato que tem individualmente mais votos do que o quociente eleitoral, se elege, independentemente dos votos dados ao partido. Ao contrário contribui para eleger outros candidatos do mesmo partido ou coligação.


Os que não conseguem alcançar o quociente eleitoral, podem ser eleitos em função  dos votos do seu partido ou da coligação feita para as eleições.


Isso cria uma distorção.Os eleitos não são os mais votados. Fora os que conseguiram mais votos que o quociente eleitoral serão eleitos os mais votados dentro quota alcançada pelo partido ou pela coligação. 


Nas últimas eleições para a Câmara Federal, em São Paulo, candidatos com cerca de 100 votos foi eleito, enquanto candidatos com 100.000 ficaram fora.

Dessa forma, os partidos buscam dois tipos de candidatos:



  • os campeões de votos, que conseguem votos superiores ao quociente eleitoral e ajudam a eleger outros candidatos do partido ou coligação, mesmo que tenham menos votos que candidatos de outros partidos. Na última eleição em São Paulo, Tiririca, pelo PR e Celso Russomano, pelo PRB, ajudaram a eleger vários candidatos, com número insignificante de votos pessoais. 

  • candidatos locais que tem poucos votos, mas que somados, ajudam o partido ou coligação a aumentar a sua quota de eleitos. Interessa ao partido registrar o número máximo de candidatos. Esse número é de 1,5 vezes o número de vagas.

A par dos votos em candidatos, o eleitor pode votar na legenda, sem indicar o candidato, ajudando o partido a ampliar a quota de eleitos.

A proposta de Michel Temer para adotar o voto majoritário, dentro de cada Estado, para a eleição dos deputados, dentro do modelo chamado de "distritão", faria com que os deputados eleitos fossem os mais votados, sem depender dos votos do partido. Mas continuariam sendo apresentados por partidos e a bancada partidária seria base para as eleições internas do Congresso, participação no fundo partidário, horário eleitoral e outras condições.

A defesa do modelo, principalmente, pelo VicePresidente da República, Michel Temer, se baseia no principio da democracia. Os eleitos devem ser os que tem mais votos. No caso dentro de cada Estado. O modelo eliminaria outras distorções: reduziria a necessidade de coligações e do excesso de candidatos. As coligações poderiam continuar em função do tempo no horário eleitoral, mantendo um valor para os "partidos de aluguel".

Os oponentes se baseiam nos impactos que a mudança pode acarretar. A principal objeção seria o enfraquecimento dos partidos. O segundo seria a perda de solidariedade e o acirramento da concorrência individual. Seria um contra todos e todos contra um. 

O cientista político Jairo Nicolau, um estudioso dos sitemas eleitorais afirma que o sistema do "distritão" é pouco usado, limitando-se a poucos paises pouco desenvolvidos. E que o sistema distrital (não distritão) foi responsável pela crise institucional no Japão, no início dos anos 90, com crescimento do custo das campanhas e da corrupção eleitoral.

Temos que considerar 4 comportamentos básicos, sendo 3 dos candidatos e 1 dos partidos:


  1. o dos campeões de votos, que podem independer do partido e escolheriam o partido com o qual tem maior afinidade ideológica e partidária, ou aquele que lhe ofereça maior suporte para a campanha. Se for novo poderá ter liberdade de escolha. Se já for deputado tem que atender as condições de fidelidade partidária;
  2. o dos que não tem certeza de alcançar sozinho votos suficientes para se eleger e precisam de apoio partidário para reforçar a sua campanha. Diferentemente do que ocorre no sistema proporcional, não precisa se preocupar com o sistema atual em que estando num partido forte, os seus votos, mesmo sendo mais altos podem perder para outros candidatos com poucos votos, puxados por um campeão de votos. A tendência seria de maior vinculação partidária. Porém na busca de votos para si pode vir a prejudicar o colega. As disputas seriam mais acirradas, mesmo dentro do  partido, ficando acima da solidariedade partidária: ninguém ajudaria ninguém. Buscaria egoisticamente o seu voto. É preciso, ademais, considerar que candidato é sempre muito otimista, achando que terá votos suficientes para se eleger. E não faltarão os "puxa-sacos" para incentivar e concordar. Fora os cabos eleitorais que querem receber algum.
  3. os que tem alguns votos locais, regionais ou grupais, mas sem perspectiva de estar entre os mais votados. No sistema atual ajudam o partido a eleger mais deputados e ficam com créditos para outras eleições, principalmente as municipais. Com o sistema majoritário os seus votos, não ficando entre os mais votados, nada valeria e não lhe angararia crédito algum. Poderá preferir concentrar as campanhas em eleições menores para alavancar eleições maiores. A menos dos que já tem cargos eletivos, a tendência é só se filiar próximo às eleições. 
  4. os partidos terão que fazer uma seleção maior, considerando duas categorias de candidatos: os bons de votos e os filiados por afinidade ideológica. A tendência seria da prevalência dos candidatos fisiológicos, mais do que os ideológicos.
Tirando uma meia dúzia de campeões de votos, que não precisam do partido para se eleger, os demais precisariam do partido e isso poderia reforçá-lo  e não de enfraquecê-lo.

Porém haveria duas categorias de candidatos, em função da sua capacidade econômica:

  • os com baixa capacidade econômica pessoal e dos seus apoiadores e eleitores, dependendo da infraestrutura dos seus partidos;
  • os com elevada capacidade econômica, que irão investir na sua campanha pessoal.
O "distritão" tenderia a favorecer o poder econômico, em dois sentidos:
  • candidato com ambição de se eleger parlamentar, seja por aspiração pessoal, relacionado ao prestígio, ou pela expectativa de vir a usufruir dos supostos beneficios do cargo, além dos formais;
  • candidato apoiado por grupos econômicos, com interesse em aprovar leis que favoreçam os seus negócios ou, ao contrário, evitar leis que possam prejudicar os seus negócios. 

Haveria então o risco do predomínio do poder econômico: do capital em detrimento dos trabalhadores e dos movimentos populares.

Também partidos, mais à esquerda que cresceram com o sistema proporcional, como o PT que vinha angariando grande volumes de votos de legenda, poderão perder densidade.

Mas no caso do PT as suas perdas decorreram da "traição" da sua direção aos ideais partidários e o envolvimento de alguns dos seus candidatos com a corrupção. Muitos eleitores, mesmo mantendo a fidelidade partidária não queriam correr o risco de seu voto favorecer a um corrupto indesejável. Isso pode explicar a redução  dos votos de legenda para o PT, nas últimas eleições.

Os partidos com base na massa de eleitores precisariam reforçar a sua imagem programática para a conquista dos "corações e mentes"daquela. Essa conquista pode se dar também pela via do populismo, com promessas de benesses através do Estado.  

(cont)










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