terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Os legados da Copa - o novo Maracanã

O principal legado positivo da Copa do Mundo de 50 foi o Maracanã. Ainda que estigmatizado por ter sido o palco da maior tragédia do futebol brasileiro, o Brasil passou a contar com um moderno e grandioso estádio, conhecido mundialmente como o palácio do futebol, com uma configuração bem diferenciada, mesmo de diversos outros que foram construídos posteriormente à sua imagem e semelhança.
Chegou a ser tombado como patrimônio histórico, artístico e cultural para a preservação de suas características principais.
Era até 2006 o principal símbolo mundial de estádio de futebol, até que o padrão FIFA passou a exigir a cobertura de toda parte ocupada pelo público, gerando uma nova configuração de estádios. 
Foi mantida intacta, com pequenas melhorias e ajustes até a sua reforma para a Copa do Mundo de 2014, que a desfigurou e retirou suas características tradicionais para ser adaptada ao novo padrão FIFA.

Reformado mediante a contratação direta da obra pelo Governo do Estado, com uma estimativa inicial da ordem de R$ 600 milhões, com os sucessivos aditivos teria superado R$ 1 bilhão, na reconstrução.

Para a sua gestão foi estabelecida uma concessão comum, com o direito da concessionária de explorar todos os negócios propiciados pelo empreendimento, cobrando os ingressos e levantando outras receitas, com a restrição do "naming right" de forma a preservar a denominação tradicional de Maracanã.

O contrato de concessão, precedida de licitação, por um período de 35 anos foi firmado com um consórcio liderado pela Odebrecht, com 90% de participação, tendo ainda a presença da AEG Administração de Estádios, uma subsidiária da AEG, uma das maiores promotoras mundiais de grandes eventos musiciais e da IMX, uma empresa nacional criada por Eike Batista para concorrer com a Time for Fun (T4F) e a XYZ, as principais empresas brasileiras do setor. 

A concessionária deveria realizar obras complementares, estimadas em cerca de R$ 600 milhões e retribuir o Governo do Estado, como ônus pela outorga da concessão, de R$ 5,5 milhões anuais, em 33 parcelas, totalizando R$ 181,5 ao longo dos 35 anos do contrato.

Esse valor não será suficiente nem mesmo para a amortização da dívida contraída pelo Governo do Estado, com o BNDES, e absolutamente insuficiente para um retorno econômico do investimento público realizado, na reforma do estádio.

Do ponto de vista do Governo do Estado, e do contribuinte carioca, será um investimento parcialmente sem retorno, mas que poderá ser compensado por outros benefícios decorrentes do aumento do turismo na cidade. Tais benefícios são difíceis de serem mensurados, principalmente destacados entre os diversos motivos geradores do aumento do turismo.

Mudanças posteriores à assinatura do contrato mudaram as condições de equilibrio econômico-financeiro da concessão, aparentemente a favor do concessionário, embora essa tenha divulgado o contrário, com aceitação pela mídia.


Os R$ 600 milhões a mais que o concessionário deveria investir seria para a demolição do Parque Aquático Julio Delamare e as instalações para o atletismo Célio de Barros, com a obrigação de construção de equipamentos similares em outra área e a construção nos locais demolidos de centro de eventos e estacionamento. Embora não divulgados, os benefícios desses novos empreendimentos seriam menores do que os investimentos. A rentabilidade marginal seria negativa. Deixando de fazer os investimentos a rentabilidade econômica do empreendimento - como um todo - melhoraria, cabendo um ajuste de equilíbrio econômico a favor do Governo do Estado. Essa questão será objeto de revisão obrigatória nos próximos governos estaduais. É uma "bomba de efeito retardado" deixado como legado.

Apesar de todas essas questões, o novo Maracanã deverá ser um legado positivo da Copa 2014. E será um legado ainda maior e mais importante se for o local onde a seleção brasileira levantará a copa pela sexta vez.

Já para o concessionário, será um negócio de risco, com probabilidade de prejuizos, a menos de uma evolução econômica do Rio de Janeiro, da cultura da sociedade carioca em relação à presença nos estádios e do acerto com o Flamengo. Pelos dados de 2013 esse é o único capaz de gerar resultados positivos para o concessionário. Mas que tem a opção de jogar em Brasilia, com resultados econômicos mais favoráveis.

O novo Maracanã foi construído para receber 76.000 espectadores, o maior estádio brasileiro, mas com uma segregação de locais. Os estudos de viabilidade econômica superestimaram (como sempre) a capacidade total considerando 78.838 lugares. 

Um grupo de lugares será comercializada diretamente pela concessionária, mediante venda de assinaturas. Serão - segundo o estudo de viabilidade obtida pelos jornais, com base na Lei de Acesso à Informação - :

  • 2.192 camarotes corporativos, 
  • 416 camarotes frisa, 
  • 4.104 assentos premium corporativos; 
  • 3.177 assentos premium; e
  • 18.000 fã tickets, 
somando 27.799 lugares. Sobrariam entre 48.201 e 51.039 para as vendas avulsas, cuja renda seria dos clubes mandantes. Esses também tem os seus sócios torcedores que pagando uma determinada mensalidade teriam descontos nos ingressos avulsos.

Nos jogos da Copa da Confederações a FIFA teria disponibilizado apenas 73.531 ingressos, com pequena sobra nos jogos contra o México e o Taiti e integralmente vendidos na final contra a Espanha. Há sempre um volume de lugares cedidos gratuitamente, sejam por obrigações legais ou por cortesia. 

Já, no Campeonato Brasileiro - primeiro turno - o maior volume de ingressos colocados á venda foi de 64.613 no jogo do Vasco contra o Botafogo, em 4 de agosto. Foram utilizados apenas 33.419 ingressos. Provavelmente por conta dos preços mais elevados, uma vez que o ingresso médio foi de R$ 41,15.
A segunda maior venda foi de 59.325 no Fla/Flu, sob mando do Fluminense, em 11 de agosto: 36.775 ingressos foram utilizados, igualmente decorrente de preços mais elevado: o ingresso médio alcançou R$ 46,32.

O maior volume de ingressos vendidos ocorreu no jogo entre o Flamengo e o Botafogo, em 28 de julho de 2013, com 52.361 ingressos disponibilizados e totalmente utilizados, mesmo a preços mais elevados dos ingressos. O ticket médio alcançou R$ 58,87. 

Nos doze jogos realizados no Maracanã, no primeiro turno do Brasileirão 2013 a média de ingressos utilizados por jogo foi de 24.844 com ingresso médio de R$ 38,77 e arrecadação total de R$ 11.557.065,00.

Os melhores resultados do Maracanã foram obtidos na Copa do Brasil, com os 4 principais times cariocas nas fases mais avançadas do torneio. Porém Fluminense e Vasco acabaram eliminados nas oitavas. 
O Botafogo chegou às quartas, mas perdeu para o Flamengo em duas partidas no Maracanã, com resultados econômicos bem distintos: no jogo de mando do Botafogo - em setembro - dos 69.259 ingressos disponibilizados, apenas 27.364 foram efetivamento vendidos, representando 39,5% do total. As gratuidades foram de 6.955, representando cerca de 10% do disponibilizado. O ingresso médio, considerando apenas os vendidos, foi de R$ 43,07, com o maior valor do ingresso de R$ 160,00.
Já no segundo jogo, com mando do Flamengo, dos 69.712 ingressos disponibilizados, 50.505 foram vendidos, com mais 9.343 ingressos gratuitos, completando um público de 59.505 pessoas. O ingresso médio foi de R$ 58,52, com o maior valor de ingresso dos mesmos R$ 160,00 do jogo anterior.
Em ambos os casos a maior frequência foi dos respectivos sócios torcedores, o que explica a diferença de tamanho de publico. O Flamengo consegue reunir mais pessoas, mais dispostas - na média - a pagar valores maiores. E o público não seria apenas dos brancos.

Passando à semi-final, o Flamengo eliminou o Goiás, com público menor que do jogo contra o Botafogo, explicável pelo fato do adversário não ser da mesma cidade. A disponibilização dos ingressos já foi menor (61.226), com venda total de 49.421, ingresso médio já maior, de R$ 68,30, e maior valor do ingresso de R$ 240,00, na cadeira Maracanã mais oeste. As sobras maiores foram dos ingressos reservados aos visitantes.

Chegando à decisão final da Copa do Brasil, após empate, sem gols, com o Atlêtico Paranaense, em Curitiba, e valendo vaga na Libertadores, o Flamengo lotou o Maracanã, apesar de preços super elevados. A mesma cadeira Maracanã mais oeste, acima referida, vendida a R$ 240,00 passou para R$ 800,00. O menor preço inteira foi de R$ 150,00, para sócio torcedor, com redução para a meia entrada. 

Foi a maior disponibilização de ingressos avulsos (71.101), dos quais foram vendidos 57.981, ao qual devem ser somadas 10.848 gratuidades formando um público total de 68.857 espectadores. Aparentemente, pelo borderô, não está incluido o público dos camarotes. Em função dos preços mais elevados, a renda total chegou próxima aos 10 milhões (R$ 9.733.785,00) com um ingresso médio de R$ 167,85 e um resultado líquido para o clube de R$ 5,6 milhões, depois de um pagamento de R$ 2,2 milhões de aluguel para a concessionária, representando 22% da receita.

Na média o Flamengo obteve melhores resultados jogando em Brasília, porém para os jogos decisivos conta com o seu público carioca, disposto a ver o seu time levantar a taça.

O concessionário estabeleceu acordos diferenciados com os diversos clubes cariocas, com perspectivas de resultados distintos. Firmando o contrato de concessão com o Governo do Estado, precisava levar os jogos dos principais clubes cariocas para o estádio, enfrentando a concorrência de Brasília que oferecia o Mané Garrincha como opção, até então bem sucedida. 

O primeiro acordo foi firmado com o Fluminense, para todo o período da concessão (35 anos), muito criticado, porém que na prática tem se demostrado favorável ao clube e desfavorável ao concessionário.
O acordo prevê que o consórcio fique com os locais de maior valor e conceda ao clube apenas 43.000 lugares, de preços mais populares e pior situados em relação ao campo.
Os demais 33.000 (ou 35 mil) lugares seriam comercializados diretamente pelo consórcio que ficaria com a receita dos mesmos.
Em contrapartida o Fluminense nada pagaria como aluguel do estádio, ficando ainda por conta do consórcio todas as despesas operacionais com os jogos. Não está claro como ficariam algumas despesas obrigatórias como a taxa de federação, a contribuição ao INSS, mas devem ser proporcionais à arrecadação.
Os jogos do Fluminense no Maracanã não tem alcançado grandes públicos, com pequena venda dos ingressos mais caros que cabem ao consórcio. 
A média de ingressos utilizados no primeiro turno do Brasileirão, foi de 22.118, com um único caso acima dos 43.000: o jogo inicial do estádio contra o Vasco.
O Fluminense que vinha com prejuizos na fase inicial do Brasileirão, jogando em Macaé, deixou de tê-los, embora com pequenos resultados, enquanto o consórcio deve estar tendo prejuizos.
Com o Botafogo o concessionário firmou acordo similar ao do Fluminense, porém com cláusula de recisão, sem multa, o que ocorreria no caso do Fluminense. E também com um valor de aluguel fixo (R$ 20.000,00 por jogo).
O Botafogo conseguiu manter a possibilidade de voltar a jogar no Engenhão, daqui a dois anos, quando as obras de recuperação do estádio ficarem prontas. Nessa ocasião, o clube deverá avaliar as alternativas, com base na experiência real dos jogos no Maracanã. 
Os seus resultados são inferiores ao obtido pelo Fluminense, com um público médio de 15.993. O seu ingresso médio, no primeiro turno do Brasileirão foi de R$ 38,63, pouco acima do do Fluminense: R$ 33,06.

Na Copa do Brasil, o Botafogo saiu-se melhor que o Fluminense, tanto no futebol, como na economia. O Flu ficou nas oitavas, com um único jogo no Maracanã, com um receita líquida de R$ 119 mil. O Botafogo chegou às quartas, com dois jogos no Maracanã, alcançando uma renda líquida de R$ 867 mil, com média de R$ 434 mil.

Já o consórcio obteve R$ 315 mil com os dois jogos do Botafogo e apenas R$ 43 mil no jogo do Fluminense.  

Com o Vasco o acordo é temporário, com um valor baixo do aluguel, mas todas as despesas a cargo do clube. Com risco de rebaixamento, o que acabou ocorrendo, o Vasco promoveu várias promoções, colocando ingressos a preços mais baixos, com pequenos resultados econômicos para o clube e para o consórcio gestor do Maracanã.

Com o Flamengo o acordo também foi temporário, valendo inicialmente apenas para 2013/2014, posteriormente estendido até 2016. 
Diversamente do acordado com os demais times, o Flamengo pagará um aluguel pelo uso do estádio, que pelos boletins financeiros da CBF, gira em torno de 22%. Não haveria distinção entre ingressos do clube e do consórcio. O resultado seria dividido entre as partes, com uma taxa crescente para o clube em função do valor. Referidas taxas não foram explicitadas. Além de vantagens acessórias, como vestiário exclusivo, loja própria para venda de produtos de marca do clube, o consórcio daria uma antecipação para ser descontado no futuro e ainda teria se comprometido com um obra no centro de treinamento da Gávea.
O Flamengo teria ainda o direito de levar 10 jogos por ano para outros estádios, como o Mané Garrincha, em Brasília.
É o maior beneficiado com a reabertura do Maracanã, pois consegue levar um grande público, muito superior ao que obtinha jogando no Engenhão. Provavelmente pelas condições de conforto, segurança e maior facilidade de acesso. 
E na final da Copa do Brasil, apesar dos preços abusivos, lotou o Maracanã, o que poderá lhe permitir sair da dificil condição econômica em que envolveu e viabilizar economicamente o consórcio Maracanã.
Os seus resultados econômicos provavelmente levará a uma revisão contratual da concessão do Maracanã, nos próximos Governos Estaduais, para efeito de reequilibrio econômico-financeiro do contrato. 


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Lula, meio livre

Lula está jurídica e politicamente livre, mas não como ele e o PT desejam. Ele não está condenado, mas tampouco inocentado. Ele não está jul...