sábado, 19 de setembro de 2020

Novas esperanças e ilusões no saneamento

 A promulgação da lei 14.026/20 que atualizou o marco regulatório do saneamento, estabelecido inicialmente pela lei 11.445 de 2007 gera novas esperanças para a universalização do saneamento, a médio prazo. E traz também ilusões.

Um rápido histórico(*) do saneamento das principais tentativas de solução do grave problema da insuficiência de saneamento no Brasil tem como um primeiro marco, o estabelecimento do Plano Nacional de Saneamento - PLANASA, em 1971,  que promoveu um grande crescimento nos investimentos no setor, financiado com recursos do FGTS  ampliando a cobertura.

(*) A melhor síntese histórica é apresentada por Carlos Alberto Rosito, vice-Presidente Nacional da ABES, em artigo atualizado em 2019 "Do PLANSA ao PLANSAB - Os últimos 50 anos da água e do esgoto no Brasil." e publicado no site de Saint Gobain (https://www.sgpam.com.br/artigos/do-planasa-ao-plansab-os-ultimos-50-anos-da-agua-e-do-esgoto- acessado em 19/09/2020)

Com a extinção do BNH, em 1986 o modelo empresarial do PLANASA, focado em empresas estaduais de saneamento, foi mantido, até os dias atuais, mas sem o mesmo vigor e contaminado por distorções corporativas e patrimonialistas. 

Uma nova centelha de esperanças emergiu com a aprovação do marco regulatório do saneamento, estabelecendo 4 segmentos e não apenas água e esgotos e prevendo a elaboração de um Plano Nacional de Saneamento. O modelo das empresas estaduais foi mantido e estabelecida a necessidade de firmar contratos(**) no lugar de convênios, termos de parceria ou outros instrumentos de natureza precária.

(**) Os contratos, sem licitação, das Prefeituras Municipais com as empresas estaduais foram denominados contratos-programas, privilegiaram essas empresas, em detrimento das empresas privadas, sujeitas a licitações para obter a concessão.

Esse privilégio foi apontado como uma das principais causas dos menores investimentos no setor, seja pela menor capacidade de investimento e endividamento das empresas de saneamento, como pelos menores resultados gerenciais e econômicos, exceto as poucas grandes.

A aprovação do marco regulatório em 2007 elevou o patamar de investimentos, dos anos anteriores, mas ainda insuficientes em relação às estimativas da universalização.

Em 2013 foi aprovado e divulgado o Plano Nacional de Saneamento - PLANSAB, estabelecendo as metas de universalização, assim como a estimativa da necessidade de investimentos. Mas seguiu sem a definição de fontes de recursos para os investimentos, 

Promoveu um novo e  pequeno avanço no patamar dos investimentos, mas ainda baixos.


A mudança do modelo

A principal mudança proposta no marco regulatório, a partir 

da prevalência, dentro do Governo, de uma visão liberal da  

economia, em contraposição ao estatismo, foi a extinção dos 

contratos programas, com a obrigatoriedade de licitações para concessões, de médio prazo.

Por outro lado foi a principal fonte de resistência ou oposição 

às mudanças, lideradas pelos Governadores do Nordeste, 

acompanhado por outros de Estados de médio e pequeno 

porte, na defesa das preferências das suas empresas estaduais 

na execução dos serviços municipais.


Com grande influência dos Governadores  junto às suas          bancadas estaduais, o Congresso deixou caducar a Medida  Provisória que estabelecia as mudanças, com o compromisso do Governo de tranformá-la em projeto de lei,  para dar maior tempo para as discussões.

O Senado se antecipou, apresentou um projeto de lei que atendia aos Governadores e aprovou-o. Na Câmara dos Deputados, por pressão do Executivo, foi apresentado outro projeto, menos favorável aos pleitos dos Governadores. Mediante negociações, acordou-se em eliminar os contratos-programas, mas admitiu a prorrogação dos atuais, desde que celebrados até 2022 e o Senado aprovou o projeto da Câmara sem alterações.

O Presidente da República, no entanto, vetou vários artigos do projeto de lei, principalmente o que previa a prorrogação dos contratos programa. Provocou uma reação do Congresso, que está considerando que o Executivo descumpriu o acordos e promete derrubar os vetos. Até que os vetos sejam votados a lei continua incompleta, gerando insegurança jurídica.


Mudar para continuar na mesma

As autoridades econômicas, as empresas privadas e a sociedade organizadas teriam ganho a batalha de eliminar os contratos programas, mas não abriram as principais oportunidades para os investimentos privados, que estariam nos sistemas das regiões metropolitanas e aglomerações urbanas.

Em 2013 o Supremo Tribunal Federal reconheceu a titularidade dos Estados dos serviços públicos de saneamento quando os sistemas ultrapassassem os limites de um único Municipio, passando a ser de interesse supra-local. Mas reconheceu a titularidade municipal, definindo uma titularidade comprtilhada.

O Estado Federativo pode exercer a titularidade dos serviços diretamente, através de órgão integrante da sua administração, ou mediante concessão, neste caso sempre precedido de licitação. Há um entendimento histórico de que as empresas públicas ou de economia mista, controladas pelo Estado, fazem parte da administração desse. A empresa estadual poderia prestar ou continuar prestando os serviços de saneamento intermunicipais, por atribuição direta, sem necessidade de contrato, tampouco de licitação.

A lei 11.445/07 com as alterações da recente lei 14.026/20 no capítulo da Titularidade não explicita o direito, tampouco proibe a atribuição direta pelo Estado titular os serviços a uma empresa integrante da sua administração(****)

O Estado titular pode não abrir licitação para a concessão, mantendo os serviços com a sua empresa estadual, restringindo o espaço das empresas privadas.

As Companhias Estaduais, com poucas exceções não dispõe da mesma capacidade financeira que as empresas privadas de porte o que significará um volume de investimento menor e prazos maiores para alcançar a desejada universalização. 

A tendência, diante dessas condicionantes, deverá ser de PPPs das companhias estaduais com as empresas privadas, o que teria menor segurança jurídica em relação às concessões plenas, mas deverá ser o viável. 

As licitações que estão em fase final de concretização são de PPPs ou de terceirizações. Os resultados efetivos marcarão a tendência efetiva.



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