segunda-feira, 27 de abril de 2015

Que período terminou? O que temos pela frente?

O sociólogo e ex-Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso publicou um artigo no jornal Estado de São Paulo (do dia 5 de abril de 2015) no qual diz que "a crise atual marca o fim de um período, embora ainda não haja percepção clara sobre o que virá." 

Ele não tem clareza mesmo sobre o período que afirma estar findo.

Ouso interpretar o quadro atual, afirmando que o período findo terminou em novembro de 2014, após a reeleição de Dilma Rousseff e a sua manifestação clara de mudança dos rumos, abandonando o desenvolvido ao longo de quase 10 anos, dos quais 5,5 como chefe da Casa Civil do Governo Lula e 4 como Presidente.

A crise atual é de transição desse período para o novo (que não é tão novo).

Desde o início do século passado o mundo vive entre dois grandes modelos de condução do país, principalmente na sua dimensão econômica.

De um lado, o modelo do livre mercado, então caracterizado inicialmente como "laissez faire" (deixar fazer) simbolo do liberalismo econômico, a cargo dos agentes privados, com o mínimo de interferência estatal, seja na produção direta, como na regulação: tanto das atividades econômicas, como da vida social.

De outro lado o modelo do planejamento nacional, também caracterizado como planejamento soviético - por ter sido implantado na União Soviética - com ampla interferência do Estado sobre as atividades econômicas, determinando o que poderia ser produzido ou consumido, assim como sobre a vida social e os comportamentos pessoais. 

O primeiro era associado ao capitalismo e o segundo ao socialismo ou à sua vertente comunista. 

A principal diferença entre as concepções estava no crescimento da renda e sua apropriação.  O primeiro apresentou maior potencial de crescimento, mas concentrava a renda entre poucos, deixando multidões na pobreza e na miséria. O grande estigma do liberalismo foi a desigualdade de renda, o que alimentava a sua oposição e a a defesa do socialismo.
Esse priorizava a distribuição de renda, mas tinha menor dinamismo de crescimento econômico. Com grande fundamentação teórica, mas sem propostas operacionais, foi implantado por vertentes parciais  como o comunismo em vários paises e pelo petismo no Brasil.

Diante desses dois modelos radicais foi proposta uma terceira via, intermediária, caracterizada pelo Estado de Bem Estar Social e, politicamente pela social-democracia.

Em torno de uma economia predominantemente dependente da exportação de bens primários, dentro do modelo liberal, o Governo brasileiro sob a liderança de Getúlio Vargas buscou, na primeira metade do século XIX, o caminho da industrialização com base em ampla intervenção do Estado na economia. Não era o modelo socialista e de planejamento estatal, mantendo um grande espaço para o setor privado. Mas buscou-se o comando da economia pelo Governo. A participação estatal se dava nos setores de infraestrutura e indústrias estratégicas, como a siderurgia. 

O modelo implantado, baseado nas teses da CEPAL, foi o da substituição de importações, voltado para um mercado interno de classe média. O comércio externo continuou sendo da exportação de produtos primários (posteriormente enfatizados pelas suas características de "commodities"). O sentido social foi promovido pela legislação trabalhista criando benefícios e garantias aos empregados formais. Seria uma aproximação com o Estado do Bem Estar Social, mas a grande parte da população, mantida na área rural, em condições de pobreza, ficou fora dos benefícios. O Bem Estar não foi para todos.

O Brasil se industrializou amplamente, sustentado por proteções alfandegárias e outras, o Estado investiu em infraestrutura e promoveu o crescimento econômico, porém às custas de elevada inflação. 

Para o controle da inflação, assim como do avanço das manifestações sociais, caracterizado como um processo de comunização, os militares promoveram um golpe de Estado e mudaram o rumo da economia, adotando a receita monetarista, patrocinada pelo FMI.  Com a redemocratização houve tentativa de retomada do modelo de ampliação da participação do Estado na economia e a ruptura com o FMI, Mas a persistência de altas taxas de inflação, levou novamente o país a seguir o modelo monetarista então caracterizado como Consenso de Washington.  Com o Plano Real conteve a inflação, mas o crescimento econômico demorou a ocorrer. Seguindo os preceitos monetaristas o Governo FHC promoveu uma ampla privatização das estatais, minimizando a participação direta do Estado na produção econômica. Permaneceu apenas com a Petrobras, empresas prestadoras de serviços públicos e bancos oficiais. A desigualdade social continuou alta gerando a insatisfação da população de menor renda, grande parte da qual tinha migrado para as cidades.

O candidato Lula e o seu partido ameaçava romper com o modelo, mas acabou cedendo às pressões do mercado e, com compromissos assumidos na "Carta aos Brasileiros" foi eleito e manteve a política monetaristas, rebatizada como o modelo do "tripê macroeconômico": meta de inflação, equilíbrio fiscal e câmbio livre. Só não deu continuidade aos programas de desestatização.

Já na metade do seu primeiro mandato, começou a afrouxar a disciplina fiscal para expandir os programas sociais. Com o sucessivo aumento da carga tributária, parte do qual herdou do Governo anterior, passou a gastar mais. Reeleito lançou um ambicioso programa de investimentos públicos, ancorado em programa da Petrobras, a última das grandes estatais criadas para viabilizar uma industrialização brasileira auto-suficiente. A Eletrobras também foi mantida, mas sem a mesma força.

A crise financeira internacional foi usada para justificar uma política anti-ciclica, baseada em gastos estatais, tanto diretos como mediante subsídios.

Eleita Presidente, continuou usando a crise internacional, embora já refreada, para justificar uma atuação mais forte do Estado e tentar restabelecer o projeto nacional-desenvolvimentista, utilizando os bancos oficiais, principalmente o BNDES como viabilizador financeiro do projeto. 

Nessa alternância entre o modelo estatizante e o liberal ou neo-liberal, ocorrida na história recente do Brasil, a tentativa de restabelecer o projeto nacional-desenvolvimentista, baseado no crescimento do mercado nacional, com a incorporação das massas, elevadas estatisticamente à categoria de classe média, no fortalecimento de uma cadeia produtiva brasileira, através das regras de conteúdo nacional e similares, o apoio aos "campeões nacionais" e outras medidas fracassou. 

Apesar do sacrifício das contas públicas, com a redução ou quase eliminação do superávit primário, o Brasil não cresceu economicamente, os empregos foram assegurados por mecanismos insustentáveis. Os benefícios sociais foram mantidos de forma suficiente para levar Dilma Rousseff a ser reeleita.

Com o fracasso do projeto nacional-desenvolvimentista gerando um grande volume de déficits e passivos encobertos, Dilma Rousseff, antes mesmo de tomar posse para o seu segundo mandato, não reconheceu mas assumiu a inviabilidade de continuidade do projeto e deu uma guinada completa para aceitar a adoção do modelo liberal baseado no tripê macroeconômico. Em contraposição ao fracassado "novo modelo macroeconômico".

O período que terminou foi o do restabelecimento  (ou da tentativa) do projeto nacional-desenvolvimentista, baseado em grande aplicações de recursos públicos, ao longo de 10 anos (descontados os dois primeiros anos do Governo Lula) com o retorno, da política monetarista.

A crise atual é de transição: da fracassada tentativa de restabelecer o modelo nacional-desenvolvimentista  com toda a sua carga de herança negativa (ou maldita) e o modelo néo-liberal na tentativa de recolocar a economia brasileira na direção do crescimento, sem inflação e mantendo a melhoria da distribuição de renda: objetivos aparentemente contraditórios.

FHC tem razão: não é o fim de uma era, ou de um ciclo. Apenas o final de mais um período decenal.

O que  virá pela frente? Não sendo sério, é fácil: um novo período. A questão é que período será esse?

No curto prazo é a sequência da política econômica neo-liberal, com os sucessivos ajustes. Se der certo a curto prazo poderá abrir espaço para a tentativa de restabelecer o projeto nacional-desenvolvimentista, com políticas setoriais.

Se os resultados forem parciais e inseguros ou instáveis seguirá até 2018, quando as eleições irão definir o rumo definitivo.

No quadro político o PMDB deverá assumir o controle do ajuste fiscal, apropriando-se do mesmo e ajustando-o segundo suas perspectivas. Com isso se apresentará em 2018 com o projeto de continuidade.

O PT, por sua vez, voltará às suas posições originais, opondo-se a ajustes que sacrifiquem os mais pobres, defendendo a tributação maior dos mais ricos, seja através de um imposto sobre fortunas ou heranças. Tornar-se-á uma oposição dentro da base aliada.

O PSDB terá que achar a terceira via, o terceiro caminho. O seu projeto principal que seria a politica monetarista, lhe foi tomado por Dilma Rousseff e vai acabar nas mãos do PMDB.

O que o PSDB pode formular e apresentar como a terceira via?

A retomada do desenvolvimento nacional, baseada em 3 pontos principais:

  1. a maior inserção da indústria no Brasil nas cadeias globais de suprimento, com foco nas multinacionais;
  2. o desenvolvimento do mundo do trabalho baseado no trabalho por conta própria, abrangendo o pauper-empreendedorismo;
  3. o posicionamento do Brasil como lider mundial da economia verde.






















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