segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Os desafios de Dilma e os cenários de 2015 - 1

O principal desafio de Dilma, que não pode esperar por 2015, é o controle da inflação. 
Se tivesse perdida a eleição, poderia ousar a adoção de medidas heterodoxas, mesmo sabendo dos efeitos desastrosos. Mas deixaria como herança maldita ao seu sucessor, com o indicador para ser usado na campanha de 2018.
Tendo ganho, um eventual tabelamento de preços e contenção dos aumentos tarifários necessários, ainda em 2014 transferiria os problemas para ela mesmo. Não tem conveniência, tampouco possibilidade de adoção dessas medidas, embora possa adotar alguma delas para forçar a taxa de inflação ficar dentro da meta.

Não tendo margem para a adoção das medidas heterodoxas, como fizeram governos anteriores, com resultados desastrosos, e estão fazendo a sua colega argentina Cristina Kirschner e o companheiro Maduro, na Venezuela, só lhe resta recorrer ao receituário néo-liberal que dizia, ao longo da campanha, ser adotado pelo adversário, caso eleito.

A primeira medida, adotada a contragosto, foi o aumento da taxa SELIC, e caso não seja suficiente, terá ainda outro aumento até o final do ano. 

Com o resultado negativo das contas públicas, terá que promover um pesado contingenciamento das contas públicas, atraso nos pagamentos e cancelamento de empenhos. Ainda que reeleita a lei de responsabilidade fiscal estabelece exigências que, se não cumpridas, coloca o governante sob o risco de perda de direitos políticos. Ela poderá virar "ficha suja" embora sem maiores efeitos práticos, porque não pode mais se reeleger e a menos de tentar se eleger senadora pelo Rio Grande do Sul (ou até por Minas Gerais) sairá da política para o ostracismo.

Mas o descumprimento da responsabilidade fiscal poderá se somar às contestações de um inevitável movimento "Fora Dilma", como consequência das revelações dos escândalos da Petrobras.

O resultado efetivo do contingenciamento fiscal dos dois últimos meses do seu primeiro governo, levará ao atraso de pagamentos das obras, com o aumento de demissões dos trabalhadores da construção civil, os conflitos com o Poder Judiciário e um aperto financeiro das Prefeituras Municipais que terão as suas transferências federais postergadas.

Os programas sociais também estarão em risco: para manter a sua continuidade o Governo recorreu à Caixa Econômica Federal, para sustentar os pagamentos do Bolsa Família, e os subsídios e financiamento do Minha Casa, Minha Vida. Não se tem clareza sobre a capacidade da Caixa em garantir as parcelas de novembro e dezembro desses programas. O Banco do Brasil também foi chamado para socorrer o Tesouro Nacional. O BNDES está pleiteando um adicional para fechar as suas contas. Dificilmente vai receber e fechará o ano no vermelho. 
Os bancos, ademais, terão que ajudar empresas e Prefeituras a pagarem o 13º salário.
Vai passar os bancos públicos, se não "quebrados" em situação difícil, para poder consertar no próximo ano. Terá que usar de muita criatividade para que as "pedaladas" sejam formalmente aceitas. O mercado, principalmente o internacional não aceitará e as agências de "rating" acabarão rebaixando as notas do Brasil. O Governo desprezará essas notas, alegando falta de informações corretas e outras desculpas de sempre.
A decisão do Banco Central, por orientação ou não do Governo, fez uma sinalização para o mercado, ainda que pesem as desconfianças: o Governo Dilma seguirá uma politica monetária ortodoxa, no combate à inflação e o Banco Central mantém uma independência (ainda que relativa). A resposta do mercado é positiva.
Com isso também anula uma possível contestação da oposição do PSDB, pois esse efetivamente faria o que o Governo está fazendo, podendo variar na intensidade.
Em contrapartida, terá que enfrentar a oposição interna, dos petistas que são visceralmente contra a política monetária néo-liberal. Até porque os resultados são os conhecidos e tradicionais: redução dos empregos. 

Isso já vai aparecer, provavelmente em outubro, mas certamente em dezembro. Porque ocorre todos os anos. Mas a sua ocorrência em 2014 será um prato cheio para a oposição.

A contenção das tarifas dos serviços públicos será mantida, mas não por muito tempo. Os custos da energia elétrica continuam subindo com a estiagem, o mesmo ocorrendo com os da água. As empresas de saneamento não aguentarão por muito tempo a redução da sua receita operacional. Embora isso seja um problema estadual, o eventual aumento das tarifas impacta os índices nacionais de inflação.

O Governo Federal não precisa aumentar o preço da gasolina, em função da queda dos preços do petróleo, mas precisa restabelecer a CIDE, para melhorar as suas contas. Com a CIDE, Estados e Municípios também podem ser beneficiados. A pressão dos Governadores será forte e a tendência do Governo Federal será ceder. Nos postos a gasolina irá aumentar, impactando também os índices de inflação.

As margens de manobra do Governo Federal, neste final de ano, são restritas e ele não tem alternativas, apesar de tudo o que Dilma afirmou durante a campanha. Terá que seguir o receituário de Armínio Fraga, eventualmente, sem a competência dele. 

O ano de 2014 terminará com a inflação dentro da meta, ainda que no limite superior, as contas públicas fecharão, formalmente corretas mas sem superavit primário suficiente para o pagamento dos juros e com geração de empregos formais negativo no último mês.  As taxas de desemprego poderão ficar baixas, mas porque os desocupados não estarão a busca de empregos, nesse período. 

O mercado ficará mais calmo, ainda que desconfiado, transferindo as expectativas para 2015. 

Para 2015 o desafio maior será promover o crescimento econômico. Se isso ocorrer, será mais fácil promover o ajuste das contas públicas e até mesmo o controle da inflação. Poderá até mesmo tentar fugir do receituário neo-liberal. Mas sem crescimento não há saída. Terá que chamar um competente monetarista.

A questão principal ainda será: "como  promover a retomada do crescimento econômico?" 

Será o tema do próximo artigo.

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