terça-feira, 4 de novembro de 2014

Os desafios de Dilma e os cenários de 2015 - 2

O que Dilma fará ou poderá fazer para promover o crescimento econômico?
O modelo desejado por Dilma, inspirado por Celso Furtado, é o desenvolvimento de baixo para cima. A parte mais pobre, do ponto de vista da renda per-capita, representa a maioria da população, consumindo cerca de 40% do conjunto e tem maior potencial de crescimento, pela dinâmica de multiplicação da renda. 
A injeção de recursos através dos programas governamentais, incluindo os programas sociais, promovendo a dinamização da economia local e regional, se refletiria num crescimento global do PIB.

Isso efetivamente ocorreu nos últimos anos, crescendo a taxas superiores ao dos demais segmentos, mas a sua participação no conjunto total, ainda que em torno de 40%, não tem capacidade de impulsionar um crescimento mais intenso, como ocorre com a economia chinesa. Esta tem, atualmente, o seu crescimento baseado na incorporação sucessiva dos mais pobres à classe média, como ocorreu também no Brasil.

Porém o multiplicador dessa renda irrigada pelo Governo à economia da pobreza é baixo, porque não criou maiores oportunidades de curto prazo para que os beneficiários pudessem obter mais renda, vendendo produtos ou serviços aos demais. 

Ocorreu na prática, com um grandes avanço dos comerciantes locais, seja de bens de consumo familiar como as farmácias e as "bodegas". Prestadores de serviços também progrediram, sejam os mototaxistas entre os jovens e as babás e outros serviços domésticos, entre as jovens. 

Mas foram poucos e, por outro lado, muitos deixaram de trabalhar, acomodados com as pequenas transferências do bolsa família, mas suficientes para sobreviver.

O Bolsa-Família deu condições mínimas de sobrevivência, de superar a fome, mas não gerou condições suficientes para a busca de uma vida melhor.

Para impulsionar o crescimento global o consumo familiar dos mais pobres precisaria ser mais que o dobro do geral. Ainda mais se os outros 60% do consumo familiar ficar estagnado ou até decrescer. Ademais além do consumo das famílias o PIB é puxado pelo consumo da administração pública, pelos investimentos e pelas exportações. Todas essas em crise.

O Brasil não tem condições de repetir o modelo chinês, em função do baixo nível de exportação dos seus produtos mais elaborados. A exportação de commodities pode gerar superavits comerciais, mas a apropriação dos ingressos é concentrada. A tecnologia faz com que os níveis relativos de emprego seja cada vez menores. Visto do lado da produtividade e da competitividade é um fator positivo. Do ponto de vista social, negativo.

A China vem aumentando a sua participação no mercado internacional, com produtos oferecidos a preços mais baixos, e absorve mais trabalhadores, promovendo a multiplicação da renda obtida com as vendas ao exterior. 

Dilma não pode contar muito com um eventual crescimento do consumo interno das classes médias tradicionais e da classe de renda mais alta.

A classe média tradicional aproveitou as facilidades proporcionadas pelo Governo Federal e se equipou. Tanto pela compra do seu imóvel próprio, como o seu carro e os equipamentos domésticos. Endividou-se e agora está no limite da sua capacidade de compra, sendo que alguns ultrapassaram, e não pode manter o mesmo nível de crescimento.  Puderam aproveitar o dólar depreciado, viajaram mais para o exterior, aproveitando para comprar lá fora, sem os pesados encargos tributários vigentes no país. Gastaram os seus ganhos lá fora. Agora com a o aumento do dólar, em relação ao real, vão refluir, mas estão com baixa capacidade para novas compras no mercado interno. 

Diante da lentidão do processo de crescimento econômico nacional baseado na distribuição de renda interna, o Governo depende do crescimento de dois segmentos da economia:

  1. a produção de petróleo;
  2. a produção capitalista dos demais produtos.
O primeiro está principalmente a cargo da estatal Petrobras e, com o apoio governamental, poderia puxar o crescimento, pois teria demanda mundial para toda a sua produção. Ainda que a preços decrescentes.

No entanto, essa alternativa está comprometida pelo açodamento do Governo anterior em acelerar a produção do pré-sal, ampliando o endividamento da empresa, contando com um retorno em prazos irreais. A produção efetiva atrasará mais do que o previsto e desejado, reduzindo a sua contribuição para o crescimento global do PIB. Contribui ainda para esse atraso, os escândalos de desvio de recursos, o que reduzem ainda mais a capacidade de investimento da empresa.

O Governo depende da produção capitalista dos empresários privados. Precisa que eles decidam aumentar a produção, assim como os investimentos. O empresariado, no entanto, perdeu confiança em relação às políticas governamentais e diante da concorrência internacional e das incertezas, refluir na produção e nos investimentos.

O empresariado elegeu os dois maiores vilões específicos que, ao seu ver restringiriam as suas decisões de produzir e investir. E ainda somam outros elementos, mas difusos que constituiriam o chamado "custo Brasil".

O empresariado quer uma reforma tributária, mas o seu entendimento é muito pragmático: quer uma redução da carga tributária. Ou seja, não entra nas complexidades das alternativas técnicas, nem sobre quem ganha ou quem perde. Para ele reforma tributária é sinônimo de redução da carga tributária. O que dificilmente irá ocorrer. Os Governos se comprometeram demais com despesas de todas as naturezas e precisam de receita para ajustar as suas contas. Uma eventual reforma tributária pode resultar no aumento da carga tributária e não o contrário. O aceno do Governo por uma reforma tributária não terá efeito efetivo para estimular a produção e os investimentos, pela incerteza dos seus efeitos sobre a atividade privada. Poderá ter efeitos setoriais, pelas desonerações seletivas. O efeito global é incerto.

A outra principal reivindicação empresarial é a reforma trabalhista, que dificilmente ocorrerá durante a gestão Dilma, em função da resistência dos trabalhadores, dos seus sindicatos e centrais sindicais.

Quatro são as questões mais críticas: 
  • redução dos encargos trabalhista, na perspectiva dos empregadores;
  • flexibilização da legislação trabalhista;
  • o trabalho multifuncional;
  • a terceirização.
A primeira é a mais difícil de ocorrer, pois do ponto de vista do trabalhador, o encargo é entendido como conquista que precisa ser preservada. O Executivo não irá apresentar projeto a respeito, apesar das reivindicações das classes empresariais. E o Congresso, incluindo a oposição, dificilmente aprovará qualquer medida a respeito, com receio de perder o apoio e os votos dos trabalhadores.

A flexibilização da legislação trabalhista é entendida como uma mudança legal que permita que o acordado possa valer mais que o legislado. Em relação a esta questão não há consenso por parte dos trabalhadores, porque entendem que muitos acordos lhe são mais favoráveis que o previsto em lei. Porém enfrentam a resistência das lideranças sindicais e, principalmente, da Justiça do Trabalho que perderia poder. As lideranças de esquerda também fazem forte oposição à qualquer abertura da CLT.

Dependerá do grau de apoio da base aliada e do comportamento da oposição. O Governo e o PT não tem segurança que conseguirão evitar essa mudança.

A possibilidade da multifunção, uma condição importante para ganhos de produtividade, estaria dentro dos acordos.

Na terceirização, o setor empresarial tende a vencer com a aprovação pelo Congresso da terceirização, sem restrições entre atividade-meio e fim. Mas com a possibilidade de veto pela Presidente. Dependerá das pressões, tanto do lado dos trabalhadores e do PT e do empresariado de outro.

Dilma enfrentará o dilema de atender aos empresários para restabelecer a confiança ou atender aos sindicatos e aos companheiros. Tenderá a favor destes, mas como corre o risco de não ter o crescimento econômico, ficará em dúvida. 

Isso leva a dois cenários básicos:


  1. Dilma mantém a sua concepção de desenvolvimento econômico, baseado no consumo de massa, despreza a economia da riqueza e não supera a desconfiança do empresariado. Esse continuará com as suas atividades, porém, sem maior ânimo e com perdas sucessivas em função da concorrência externa. Não fará a reforma tributária redutora da carga fiscal, tampouco a reforma trabalhista, mantendo o alto custo Brasil. A indústria no Brasil ficará estagnada, ocorrendo a desindustrialização, nos dois sentidos. A melhoria só ocorrerá na infraestrutura, com a conclusão das diversas obras iniciadas anteriormente que serão completadas. Dependerá da Petrobras, tanto da sua produção, como das suas compras e das exportações do agronegócio para sustentar um mínimo crescimento. 
  2. O Governo, apesar das resistências conservadoras, tanto da esquerda como da direita, acede que para sustentar o crescimento econômico não pode ficar na dependência do lento crescimento do seu imenso mercado interno. O usará como alavanca para novos empreendimentos de grande escala, voltados para o mercado mundial. Aceitará a hospedagem pelo Brasil de plataformas de exportação das multinacionais, com a concessão de benefícios fiscais e outros, ampliação da infraestrutura e acordos comerciais mais amplos, deixando de ficar limitado ao Mercosul.

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