terça-feira, 14 de outubro de 2014

Bolsa Família - seguro desocupação

O Bolsa Família se tornou um seguro desocupação para muitos trabalhadores informais, com pouca renda.

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Apesar do lema deste blog "ver o que não é mostrado" não havia percebido uma realidade que me foi mostrada pelo meu compadre baiano e depois pelos "causos" contado por outros amigos.

Tenho trabalhado, paralelamente, com a questão do trabalho informal, tentando entender melhor porque os informais resistem em se formalizar.

Sempre achei que o Bolsa Família, pelos seus valores não tinha condições de tirar os beneficiários diretos da pobreza, e que a tal nova classe média emergente era formada pelos "atravessadores" que, vendendo para aqueles beneficiário conseguiram melhorar a sua renda e ampliar os seus patrimônios.

Mas ouvindo me contarem sobre o crescimento dos moto-taxis nas cidades interioranas da Bahia, mas que se repetem em outras cidades menores, inclusive de São Paulo, "caiu a ficha". Muitos da classe média emergente que melhoraram de vida vendendo para os beneficiários são eles mesmos. 

A pessoa que recebe o Bolsa Família, não se contenta com ela e busca um trabalho, que o pratica como informal. Seja como diarista numa residência, para limpeza ou cuidados de crianças ou idosos, ou como prestador de serviços de taxi, em moto, não quer se formalizar. Porque como formal, tem que declarar a sua renda e perde o direito ao Bolsa Família.

Mantém as duas ou mais fontes de renda, e não deixa o Bolsa Família, porque esse é pouco mas seguro (ou supostamente seguro). Funciona como um seguro desocupação. 

A irrigação de recursos do Bolsa Família, numa comunidade pobre, é pouco individualmente, mas significativo no conjunto e gera uma demanda adicional por produtos e serviços. O valor adicionado sobre os produtos é pequeno para o comerciante local, mas o dos serviços maior e diretamente incorporado pelo prestador do serviço. 

O moto taxi emergiu como oportunidade bem aproveitada por nano e micro empreendedores que, com isso, puderam adquirir um veículo motorizado para uso próprio e da família e ainda gera renda. Cobrando entre R$ 1,00 a R$ 2,00 por viagem, ao final do mês dobram ou mais que dobram os ganhos do Bolsa Família. Esse, provavelmente, deu lastro para a compra financiada da moto.

Esse fato mostra equívocos de percepção sobre a realidade do Bolsa Família (que eu mesmo incorria, por falta de percepção e algum preconceito). Por que ver via, mas não percebia.

Dizer que o Bolsa Família não oferece a "porta da saida", para o beneficiário conseguir um emprego e sair do programa é falso. Ele não sai para um emprego formal, mas trabalha em paralelo (ou seja, não se torna um indolente) por uma "portinha" do lado pelo qual sai e entra todo dia. E é ele mesmo que passa da categoria de pobre para classe média emergente: com maior capacidade de consumo.

Quando as empresas reclamam que por conta do Bolsa Família tem maiores dificuldades de contratação, pois as pessoas não querem trabalhar, a interpretação também é equivocada.

Elas querem trabalhar sim e poder ganhar mais. Mas não querem como empregados formais, porque nesse tem muitos descontos e perde o Bolsa Família. 

Agora deu para entender melhor porque na favela ou na pequena cidade interiorana há uma multiplicação de renda, uma ascensão social, mesmo com os pequenos valores individuais do Bolsa Família. E porque pouco saem do programa, apesar dos indícios de melhoria de vida dos seus beneficiários e das estatísticas sociais.

Do ponto de vista macro ou meso econômico, a informalidade dos trabalhadores de baixa renda não é um problema, mas uma solução.

Achar que a solução do trabalho está apenas no emprego formal, na carteira assinada é uma visão elitista, fora da realidade. 

Foi com a percepção e utilização dessa realidade que Jaques Wagner virou a eleição na Bahia, e Dilma Rousseff tem um grande eleitorado fiel, que a oposição não consegue abalar. 

Bolsa Família não é "esmola" mas um "seguro desocupação" dos trabalhadores informais. 

O alívio para a oposição, apesar da incompreensão, é que os impactos econômicos do modelo parecem estar se esgotando. 

Mas se vencer as eleições terá que entender melhor essa realidade, antes de pretender introduzir supostos aperfeiçoamentos que poderão destruir os seus impactos benéficos. 

O principal é que não adianta pretender que a porta de saída seja o emprego formal: celetista. 

A saída está na formalização do nano empreendedor, com o direito de retornar ao Bolsa Família, como um seguro desocupação à semelhança do seguro desemprego para o celetista.

Um comentário:

  1. Muito esclarecedora esta postagem, serviu também para que eu, assim como você, mudasse meu posicionamento em relação ao bolsa família, nunca fui contra o programa em si, mas a forma como ele é administrado, acho que cabe ao governo acompanhar os usuários e dar à eles condições para que saiam do benefício, mas para isto o governo precisaria profissionalizar e inserir no mercado de trabalho as pessoas que fazem uso deste benefício, fiscalizando por um determinado tempo esta inserção do beneficiário no trabalho. Com relação aos fatos mencionados na postagem, dependendo da região, acho que não é regra, são exceções, pois em determinadas regiões os beneficiários deste programa em uma esmagadora maioria se acomodam e não estão interessados em profissionalizar-se e muito menos em trabalhar.

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