quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Um passo adiante

Os mecanismos de distribuição direta de dinheiro aos pobres, através do bolsa-família, aposentadorias rurais e pensões da assistência social, são percebidas por esses como um ganho proporcionado por Lula. A gratidão deles assegurou a reeleição de Dilma. Mas muitos já demonstraram que querem mais. Nenhum dos três principais concorrentes à Presidência soube oferecer propostas aceitáveis para aqueles. Dilma, com o seu marqueteiro, foi quem mais se aproximou, embora as suas manifestações não correspondam ao pensamento majoritário do PT e das organizações de esquerda.Dilma incorporou no seu discurso, o trabalho por conta própria, que não é o caminho preferido ou desejado pela esquerda: o objetivo desta é a universalização do regime celetista. A esquerda ainda associa do trabalho por conta própria como trabalho precário ou não decente. 

O PT tentou a desconstrução dos adversários acusando-os de que eles, se eleitos, iriam acabar com o bolsa família. Marina Silva, usou a sua história, para desmentir, junto ao eleitorado, que poderia fazê-lo: "quem já passou fome, sabe da importância do bolsa-familia". Aécio não. Por isso não conseguiu a transferência de grande parte dos votos dados a Marina no primeiro turno.
Aécio em sua defesa usou dois argumentos que "não pegaram": a 13ª bolsa e que os programas foram criados pelo PSDB, ainda no Governo FHC. Quem foi o pai da criança não tem importância. O que conta é o presente e o futuro. 

Os beneficiados não querem apenas a sua manutenção e atualização dos valores. Querem continuar melhorando de vida. Querem que o Governo os ajude a encontrar e desenvolver as oportunidades de trabalho e renda, com base no seu esforço pessoal. 

Todos tem o mesmo mantra, que é uma visão de "cima para baixo": a solução, a saída é a educação. E todos oferecem variantes de educação, dentro da suposição de que mais e melhores educados (no sentido formal) eles conseguirão melhorar a sua vida.

Casos concretos, pesquisados e difundidos, seja pela propaganda oficial, como pela mídia independente confirmam a ascensão sócio-econômica daqueles que tiveram e tem maior oportunidade de estudar. Não faltam casos de favelados que se tornaram médicos, engenheiros e outros profissionais de nível superior. Não são muitos, ainda são exceção e não a regra, mas são fartamente usados para gerar uma impressão de alcance popular. O caso mais emblemático de ascensão social pela educação, é de Marina Silva, analfabeta até os 16 anos.

Não há maior consenso dentro da sociedade brasileira de que a solução é a educação. Mas a sua compreensão e influência sobre as decisões eleitorais são diferentes.

A visão e proposta do Governo são dadas pelo que tem feito: recursos para a educação, qualificação técnica pelo PRONATEC, subsídios e financiamentos para o estudante da educação superior, de um lado, e a formalização dos micro e pequenos empreendedores, através do MEI e Super Simples.

Marina Silva, por influência de Neca Setúbal, focou - inteiramente - as suas posições e propostas em torno da educação, ainda que de forma difusa, do ponto de vista, da imagem. Não teria tido grande alcance, além da visão de que manteria os programas sociais. Isso explicaria uma expressiva votação, mas insuficiente para tê-la levado ao segundo turno.

Aécio Neves demonstrou incompreensão. Ficou na defensiva e na crítica, focando o seu discurso em torno da creche. É uma visão tecnocrática ou educanocrática. Essa vê a creche como pré-escola.

Para a mãe pobre creche é o local onde ela deixa a criança para ser cuidada enquanto vai trabalhar. Creche não é percebida como educação e a idéia de pré-escola é uma construção elitista.

Ocorre aqui mais uma contradição entre os programas e propostas, mal percebidas. 

Há um preconceito de que os beneficiários do bolsa-família se acomodam e não querem trabalhar. Ora, se isso é verdade, não há necessidade de creches. As mães, tem bolsa família, podem ficar em casa, cuidam dos filhos pequenos e não precisam deixá-los por conta de terceiros. A menos que entendam que creche é a primeira etapa da educação formal. O que ainda não ocorre.

As mães querem e precisam de creche porque "trabalham fora" e precisam deixar as suas crianças com alguém. 

Mas se trabalham, porque continuam com o bolsa família? Rigorosamente deveriam sair do programa, por ter uma outra fonte de renda e não ser mais uma "pobre absoluta".

Por que o seu trabalho é de natureza informal. E ela acumula as duas fontes.

Ao contrário do que povoa o imaginário da classe média urbana, os beneficiários do bolsa-família não estão, nem querem ficar acomodados com o pequeno benefício. Não querem perdê-los, mas saem para "ralar", ganhar um pouco mais e melhorar de vida.

As propostas dos partidos tem que partir dessa realidade. O que está em discussão não é o bolsa família. Mas como ir além desse, para atender as aspirações dos beneficiários. 

(cont)

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Lula, meio livre

Lula está jurídica e politicamente livre, mas não como ele e o PT desejam. Ele não está condenado, mas tampouco inocentado. Ele não está jul...